terça-feira, 26 de abril de 2011

Persona

Eu sempre tive um encantamento pelas mascáras venezianas... É fasciante, esconde histórias, símbolos,pessoas e vidas.
Um pouco mais dessa história!


Beijos ácidos!

















No latin, a palavra que designa máscara é persona, usada para definir as qualidades do ser representado. Tal é a origem da palavra pessoa, como usamos atualmente. Com as máscaras, nos transformamos em outra pessoa, adquirimos uma nova personalidade, apta a enfrentar qualquer realidade. Não raro usamos máscaras invisíveis, quase imperceptíveis, que nos ajudam a enfrentar as mais diversas situações. Entretanto não são sempre imaginárias, as máscaras são também reais e palpáveis, desde as épocas mais remotas da história da humanidade. Pode-se dizer que as máscaras representam uma espécie de mediação entre os homens e o mundo invisível. São uma expressão da fé na existência de entidades sobrenaturais. Pelo menos, assim é visto este objeto em várias culturas.

Pré-história
Usar uma máscara, portanto, significa deixar de lado uma personalidade cotidiana para assumir as qualidades do ser que ela representa. Esta descoberta deve-se ao homem primitivo e ficou gravada nas paredes das cavernas da Idade da Pedra. O mais antigo registro do uso de máscara que se tem notícia foi deixado nas paredes da caverna de Lascaux, na França, mostrando caçadores mascarados com cabeças de animais. Era uma forma de o homem adquirir as forças destes animais e assim garantir o sucesso da caça.

Caverna de Lascaux – uma das mais importantes canernas decoradas do período Paleolítico, possivelmente habitada desde 15 mil anos antes da nossa era. Fica em Montignac, na França, e foi descoberta em 1940, posteriormente fechada ao público a partir de 1963, com o propósito de se preservar as pinturas. Suas paredes são ricamente decoradas com figuras de cavalos, cervos, cabras, felinos e outros animais, cuja simbologia é desconhecida.

Egito
Mesmo com a evolução do homem, as máscaras continuaram presentes em praticamente todas as civilizações. Em algumas culturas, sua provável origem está na pintura corporal feita em rituais primitivos. Esta conotação mágico-religiosa apareceu no Egito, onde se faziam máscaras para colocar no rosto dos mortos para auxiliá-los na arriscada passagem para a vida eterna que eles acreditavam existir. Eram também usadas em situações que exigiam mais que simples habilidades humanas, como para propiciar a cura de doenças e evitar o perigo de acidentes.

Grécia e Roma
O uso das máscaras nem sempre teve conotação mágica, pelo contrário, esses objetos tiveram função protetora em algumas civilizações, como a grega e a romana. Entre os anos de 700 e 675 a.C., o exército grego era bem equipado com capacetes com máscaras protetoras. O exército romano também os utilizava nas batalhas e ainda havia máscaras especiais para desfiles. Durante 650 anos, em todo o Império Romano, os gladiadores fizeram uso destes capacetes nos circos romanos para encenar com feras para o público.

No Teatro
Na arte de representar, as máscaras foram largamente aproveitadas. Os gregos foram os primeiros a usar máscaras no teatro. Elas identificavam o personagem em cena, definindo inclusive seu caráter e sentimentos. Tanto é que a palavra hipócrita vem do grego: hypokrités, que significa ator, ou seja, a pessoa que tem várias faces por causa do uso constante de máscaras. Algumas delas tinham características de deuses, semi-deuses, reis e heróis das tragédias. Eram confeccionadas em barro, madeira, cortiça e adornadas com pinturas e cabeleiras. No séc. V a.C., elas foram aperfeiçoadas e sua execução passou a ser confiada a escultores. Não se buscava apenas a aparência e a expressividade, mas também o recurso técnico de ampliar a voz do ator, como se fosse um megafone, para que se pudesse fazer ouvir por todo o anfiteatro. Isto era possível graças a uma abertura exagerada dos lábios da máscara ou com a colocação de lâminas de metal no seu interior, próximo à boca. Este mesmo tipo de máscara foi usado no teatro romano, que surgiu no séc III a.C. por influência grega.


Confecção
Na verdade, as máscaras demoraram para ser introduzidas no teatro latino. A princípio, os atores pintavam o rosto quando interpretavam papéis femininos. As primeiras máscaras romanas eram adornadas com peruca provida de mola e orifícios no lugar dos olhos; usavam-se materiais diversos, como casca de árvore, madeira, terracota, bronze e couro forrado com pano. Seu tamanho era proporcional ao anfiteatro, para que pudessem ser vistas por todos. Tanto na tragédia quanto na comédia ou na sátira, elas deveriam ser inteligíveis ao público para que cumprissem sua função de representar. Ainda assim, não era raro que durante as apresentações os atores as retirassem por exigência da platéia, que queria conferir sua real expressão fisionômica.

Outras funções
Além de terem sido bastante usadas nas encenações, muitos artistas as imortalizaram em esculturas e pinturas de vasos de cerâmica usados na decoração. Tanto os gregos quanto os romanos usavam máscaras em cerimônias religiosas, como nos enterros. Mais tarde, na China e sudeste da Ásia, as máscaras de dragão foram usadas para afastar os maus espíritos, bem como na Áustria e Suiça, onde máscaras com esta função tinham aspecto bem grotesco. Passado muito tempo de uso de máscaras em diversas civilizações, com os mais diferentes propósitos, a Idade Média marcou seu desaparecimento quase por completo, conservando-se o uso apenas em festas religiosas.








 
O Renascimento de uma arte
Seu ressurgimento deu-se na Renascença, quando voltou ao teatro com a redescoberta da comédia. Na Itália, os personagens estereotipados da comédia latina transformaram-se em tipos nacionais e provincianos da Commedia dell’Arte, surgida na Sicília, que arrasava as aspirações mais nobres do homem de ascender a um mundo melhor. A comédia mostrava assim a faceta ridícula de tudo o que era institucionalizado e admirado, inclusive criticando os poderosos através da caricatura. Por isso as máscaras da Commedia dell’Arte, ao contrário do teatro clássico, apesar de serem muito intensas, não remetiam a uma expressão em particular, estavam sujeitas a interpretações diversas. Fundamental então era o trabalho corporal do ator, como se fosse um suplemento para a máscara, expressando o que ela por vezes não podia.



Personagens
Muitas destas máscaras eram feitas em couro fino, costuradas na roupa branca, sendo as mais conhecidas as dos personagens Pierrot, Colombina, Pulcinela e Arlequim. A Commedia dell’Arte inspirou o carnaval de Veneza, na Itália, que incorporou as máscaras, agora cobrindo apenas metade do rosto, deixando à mostra a expressão da boca. Algumas foram simplificadas a uma singela faixa de veludo, em geral, negra. Estas máscaras primavam pela delicadeza e eram inspiradas nos personagens da comédia. Em Veneza e até em Florença, as máscaras passaram a ser peça de indumentária feminina, como forte elemento de sedução. Até hoje a produção de máscaras em Veneza é tradicional e lucrativa.






As máscaras no Brasil
Estas máscaras de carnaval chegaram ao Brasil no século XIX, encarregadas de expressar mitos, crítica social, ironia em relação às dificuldades cotidianas, enfim, desejos do imaginário. Estas máscaras de cunho artístico encontraram no Brasil outras de caráter ritualístico, mágico-religio, introduzidas pelos cultos africanos. As máscaras da África não traduziam a emoção do indivíduo; não era o retrato do homem que teme, que combate, que morre, mas era, sim, o próprio temor, a guerra, a morte. As máscaras usadas em rituais primavam pela intensa expressividade e serviam como mediação entre a esfera sobrenatural e a natural. Estas só podiam ser produzidas com autorização do chefe religioso por um escultor iniciado na magia e que antes submetia-se a um rito de purificação. Nem todas as madeiras eram utilizadas em razão das qualidades negativas atribuídas a determinadas plantas, nas quais habitariam os espíritos malignos, o que comprometeria a eficácia da máscara. Estas crenças chegaram ao Brasil através dos escravos e serviam para garantir a adaptação do indivíduo à comunidade

 
As máscaras dos índios
Havia também as máscaras usadas pelos índios nas cerimônias de iniciação, culto à fertilidade e outras manifestações religiosas. Algumas representavam animais e forças da natureza, como raios, chuvas e trovões. A confecção destas máscaras era de caráter coletivo. O material usado, como cascas de árvores, resina e até madeira, eram considerados sagrados.

O Folclore e o homem de hoje
Atualmente o folclore em geral por vezes resgata um pouco todas estas máscaras para caracterizar personagens e relembrar a história de uma comunidade. O folclore brasileiro, movimentado e plástico, utiliza as máscaras justamente para manter tradições; é uma espécie de memória histórica, que garante ainda o exercício da fantasia. O teatro também tem recriado as máscaras cada vez com mais freqüência. Para o homem de hoje, as máscaras deixaram de ter um sentido puramente mágico para assumir uma função de disfarce psicológico, possibilitando o anonimato, ou seja, é como se ele pudesse esconder sua verdadeira face e adquirir total liberdade em um mundo tão complexo.







Máscaras no Teatro NÔ
Fotos: Reprodução



Uma tradicional arte dramática janonesa, repleta de simbolismo e refinamento, que já tem mais de 600 anos, é o teatro NÔ. Resultante da combinação de canto, dança, declamação, instrumentos e indumentária, o NÔ é um espetáculo de máscaras por excelência. São basicamente três os tipos de máscaras, dos quais se originaram outros tantos: máscaras de divindades sobrenaturais, de anciãos e de mulheres. Seu apelo é primitivo, abrupto, forte e ao mesmo tempo sutil e lírico. Estas máscaras têm o poder de estabelecer contato entre homens e deuses. Na verdade, esta peça é bem mais que um figurino, é uma parceira do ator, que lhe confere forças ocultas, mágicas. Vestir a máscara é um ritual em si. O ator, já com a roupa do personagem, observa a máscara que logo será seu rosto. Quando a veste, o artista passa a ser o personagem, pois colocar a máscara significa injetar nela corpo e alma, com os quais ela passa a viver. Nestas máscaras, o ator tem a visão limitada por estreitas aberturas e só consegue ver o chão através das fossas nasais existentes no objeto, orientando-se espacialmente através dos pinheiros e pilares do palco.








As mais antigas, criadas em Muromati, eram verdadeiras obras-primas; esculpidas em madeira, recebiam a pintura de rostos de jovens e mulheres de expressão neutra, enriquecidas por recursos sutis. Um deles era a diferença entre os dois lados do rosto_ quando o protagonista sofria um conflito, o público via a face direita entristecida; assim que este era resolvido, a face esquerda, alegre, era mostrada aos espectadores. Se o ator olhasse para baixo, os lábios da máscara pareciam cerrados, indicando melancolia; olhando para cima, os lábios ficavam entreabertos, apresentando um sorriso. Os olhos das máscaras femininas tinham pupilas quadradas, dando ar de doçura. Enfim, são detalhes que propiciam a gradação das expressões. O fabrico das máscaras requer grande habilidade e, hoje, apesar de haver muitos aprendizes, há pouquíssimos escultores que produzem para os grupos profissionais. Mesmo com tanta riqueza, a arte NÔ por pouco não foi extinta, já que ela esteve por muito tempo associada ao xogunato. Grupos isolados no Brasil ainda mantêm a tradição do Teatro Nô e suas máscaras.













Fonte do Texto e pesquisa:

Pesquisa e texto: Danielle Giannini / Fotos: William Silveira

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